A nova revolução tecnológica em curso não se limita ao avanço de dispositivos ou serviços digitais: ela refunda as bases do poder global.
Com o impulsionamento de tecnologias como inteligência artificial (IA), computação quântica e sistemas semicondutores, o mundo vive uma corrida que vai além da economia — e entra diretamente no terreno da geopolítica e da soberania digital.
Neste cenário, a relevância tecnológica se tornou um ativo estratégico de nações. Ter autonomia sobre infraestruturas críticas, acesso a dados, capacidade de inovação e controle sobre a cadeia produtiva digital passou a ser uma questão de segurança. O que antes era um jogo de mercado, agora é xadrez de Estado.
Para entender os contornos dessa disputa, o Futurecom Digital entrevistou o advogado, professor e pesquisador Ronaldo Lemos – que é keynote speaker na 30ª edição do Futurecom -, especialista em tecnologia, mídia e propriedade intelectual, reconhecido por sua atuação em políticas públicas e regulação digital.
Confira o que ele compartilhou conosco sobre o tema!
Uma corrida comparável à nuclear
Segundo Lemos, a atual corrida pela supremacia tecnológica tem características únicas: “Essa nova corrida é marcada pelo embate geopolítico direto em torno de tecnologias emergentes como Inteligência Artificial (IA), computação quântica e semicondutores”, afirma.
Diferentemente das revoluções anteriores — como a da internet ou da mobilidade —, hoje, são os governos que lideram os investimentos e as diretrizes estratégicas. A competição deixou de ser apenas econômica.
“O pacote de US$ 52 bilhões dos EUA para acelerar sua indústria de chips, aliado às restrições de exportação contra a China, exemplifica como essa competição se tornou uma situação de segurança nacional”, explica Lemos.
“Tudo isso lembra a corrida nuclear. Dá para dizer que a IA está sendo tratada da mesma forma como a tecnologia nuclear a partir dos anos 1950”, compara o especialista.
Soberania digital como nova fronteira
Nesse contexto, o conceito de soberania digital ganha centralidade. Mais do que controlar dados e redes, trata-se de garantir autonomia sobre os pilares tecnológicos e estratégicos de uma nação — incluindo os minerais críticos que sustentam a cadeia produtiva da inovação.
“Cada bloco tem respondido de forma diferente”, observa Lemos. Ele explica que: “A União Europeia tem atuado por meio de regulação, como o Digital Markets Act (DMA), que obriga gigantes como Apple e Google a abrirem os seus sistemas a concorrentes locais. Já o Brasil lançou recentemente sua Estratégia Nacional de Cibersegurança, com foco na proteção da infraestrutura crítica e dos dados nacionais”.
No entanto, o especialista alerta: “Ainda há muito por fazer. Soberania digital exige não só leis, mas infraestrutura, talentos e capacidade de articulação entre os setores público e privado”.

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Brasil entre avanços locais e ausência federal de rumo
Questionado sobre o posicionamento do Brasil na corrida global, Lemos é direto: “O Brasil tem adotado uma postura mais defensiva ao nível federal, com leis que copiam o modelo europeu, e mais assertiva ao nível estadual.”
Ele cita como exemplo o estado de Goiás, que aprovou a primeira legislação estadual sobre IA, com incentivos à atração de datacenters com energia renovável e uso ético da tecnologia.
Lemos também aponta o caso do Ceará, que se destacou ao atrair um investimento de R$ 50 bilhões do TikTok para infraestrutura digital.
“Contudo, ainda falta um plano mais claro na esfera federal”, critica o especialista.
Em suas palavras: “O governo dá sinais contraditórios: quer acelerar e frear a IA ao mesmo tempo. É preciso ter um norte mais claro e articulação entre academia, indústria, sociedade e poder público para que o Brasil assuma um protagonismo global consolidado.”
Inovação versus regulação: um dilema em aberto
A tensão entre inovação e regulação é outro ponto sensível. Para Lemos, o embate é especialmente visível no debate sobre inteligência artificial. “O Projeto de Lei 2338/23, que copia regras europeias, enfrenta críticas por seu potencial impacto negativo na inovação ao ser rígido demais”, afirma.
A solução para isso seria a adoção de modelos regulatórios mais ágeis e adaptáveis.
Nas palavras de Lemos: “Precisamos adotar sandboxes regulatórios — como os aplicados em Goiás — que permitam experimentação controlada, rápida adaptação normativa e participação ativa de diversos setores.”
Ele cita a experiência europeia como alerta: “O EU AI Act entrou em vigor parcialmente sob questionamentos da própria Comissão Europeia e de países como Suécia e Polônia. Isso mostra que a regulação precisa ser dinâmica e aberta ao diálogo com a inovação.”
Ecossistemas locais: o motor da autonomia
Lemos enfatiza que a soberania tecnológica não será alcançada sem o fortalecimento de ecossistemas locais de inovação. Para ele, iniciativas regionais que articulam academia, setor privado e poder público são fundamentais.
“Brasília lançou o Centro de Inteligência Artificial Aplicada (CIIA-DF), com investimento inicial de R$ 5 milhões. Goiás tem o CEIA, vinculado à UFG. Essas iniciativas são essenciais para reduzir dependência externa, fomentar talentos locais e garantir autonomia real”, argumenta o advogado.
Além de centros físicos, ele destaca a importância da infraestrutura digital aberta à inovação: “Não falamos só de prédios e laboratórios, mas de software, bancos de dados, redes de compartilhamento de conhecimento. É esse o caminho para resiliência e protagonismo sustentável”.

O que está em jogo: o futuro da relevância global
A nova corrida global pela relevância tecnológica não será vencida apenas com boas intenções. Exige clareza estratégica, investimentos contínuos, alianças inteligentes e — acima de tudo — vontade política. “Se não assumirmos o controle do nosso destino digital, ficaremos reféns de interesses externos”, alerta Lemos.
Com um mundo cada vez mais polarizado entre potências digitais, o Brasil precisa decidir qual papel deseja ocupar. A boa notícia é que há talento, capacidade técnica e vontade nos estados e ecossistemas locais. Mas é urgente que o país unifique os seus esforços e trace uma rota clara.
Porque, como lembra Ronaldo Lemos, “relevância tecnológica não é um luxo. É a base da soberania, da segurança e do desenvolvimento no século XXI.”
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