O abismo digital na educação brasileira é um desafio histórico, intensificado nas vastas áreas rurais do país. Dados da pesquisa TIC Educação 2024 (do Cetic.br, publicada em 2025) comprovam o cenário: embora o acesso geral à internet nas escolas rurais tenha crescido, alcançando 89%, a infraestrutura para uso pedagógico efetivo ainda é precária.

Apenas 66% das escolas rurais possuem acesso à internet disponível para o uso dos alunos, em comparação com 88% das escolas urbanas.

Essa dificuldade de acesso efetivo impede que milhões de alunos tenham as mesmas oportunidades de aprendizado. Para mudar essa realidade, a Lei do FUST (Lei 14.172/2021) redefiniu o uso dos recursos do fundo, estabelecendo como prioridade a aplicação de verbas não-reembolsáveis para expandir o FUST nas escolas rurais.

Essa mudança legislativa foi um marco. Antes, o FUST era majoritariamente usado para financiar a expansão de redes das próprias operadoras. Agora, o foco é o investimento direto em projetos de impacto social que não geram retorno financeiro imediato para as empresas, mas sim um retorno incalculável para a sociedade.

O programa de conectividade à internet para escolas rurais é a principal ferramenta do governo para garantir que a infraestrutura digital chegue onde o mercado, sozinho, não chega.

Com a nova diretriz, o fundo passou a financiar projetos que levam banda larga de alta velocidade para instituições públicas de ensino, especialmente as localizadas no campo, em comunidades indígenas, quilombolas e assentamentos. O objetivo é claro: universalizar o acesso e garantir que a tecnologia seja um vetor de inclusão, e não de desigualdade.

Como o FUST promove a conectividade educacional?

A aplicação do FUST na educação vai além do financiamento. O fundo atua como um catalisador para políticas públicas, baseando-se em um diagnóstico preciso da desigualdade digital para direcionar investimentos de forma estratégica e eficiente.

O que é o FUST e a mudança estratégica da Lei 14.172/2021

O Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) foi criado pela Lei 9.998/2000. Sua finalidade original era cobrir custos de serviços de telecomunicações não lucrativos, mas essenciais, como a telefonia fixa em áreas remotas. Por anos, seu uso foi limitado, gerando um grande acúmulo de recursos.

A Lei 14.172/2021 modernizou o FUST. Ela permitiu o uso dos recursos em modalidades não-reembolsáveis, ou seja, investimentos diretos sem necessidade de devolução. A lei também determinou que a prioridade absoluta seria a internet para escolas públicas rurais e urbanas de áreas vulneráveis, impulsionando programas de conectividade educacional em larga escala.

O diagnóstico da desigualdade digital no campo

Os dados da TIC Educação 2024 (publicada em 2025 pelo Cetic.br) evidenciam a urgência da aplicação do FUST. O gargalo não está apenas na conexão, mas na disponibilidade de equipamentos para os estudantes. O diagnóstico é claro: apenas 28% das escolas rurais possuem, simultaneamente, acesso à internet e computadores disponíveis para o uso dos alunos.

Esse número contrasta drasticamente com a realidade das escolas urbanas, onde o índice de infraestrutura completa (internet e computadores para alunos) chega a 76%. Essa carência de infraestrutura adequada na zona rural limita o uso de recursos digitais, plataformas de ensino e ferramentas colaborativas, perpetuando a desigualdade no aprendizado.

Fonte: Cetic.br

Quais são as dificuldades enfrentadas pelos alunos da zona rural?

As dificuldades vão muito além da falta de sinal, impactando diretamente o que o aluno pode fazer em sala de aula. Alunos em escolas sem a infraestrutura digital adequada, uma realidade na maioria das zonas rurais, são privados de recursos pedagógicos básicos. A TIC Educação 2024 (Cetic.br) comprova essa defasagem na prática.

Em escolas que não dispõem de computadores e internet para os alunos, apenas 22% dos estudantes conseguem fazer pesquisas na Internet durante as aulas (contra 56% nas escolas equipadas). A disparidade se repete em outras atividades: só 19% fazem lições e exercícios online (contra 53%) e apenas 15% leem livros digitais (contra 40%).

A falta de conectividade à internet para escolas rurais limita o letramento digital, essencial para o mercado de trabalho, e aprofunda a desigualdade educacional.

Saiba mais: Transformação digital na educação: desafios, ferramentas e exemplos

Como o FUST chega às escolas rurais?

A transformação do FUST em uma ferramenta prática de conectividade exige uma operação complexa. Para que o recurso saia do fundo e se transforme em internet na escola, há um ecossistema que envolve gestão financeira, editais públicos e requisitos técnicos rigorosos.

O papel do BNDES como agente financeiro

Nessa nova estrutura, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) atua como o agente financeiro do FUST. O banco é responsável por operacionalizar os recursos, estruturar os projetos e, fundamentalmente, lançar os editais públicos.

O BNDES não apenas gerencia o desembolso, mas também seleciona os projetos apresentados por operadoras, Provedores de Internet (ISPs) e outras entidades. O banco avalia a viabilidade técnica e o alinhamento dos projetos com as metas estabelecidas pelo Conselho Gestor do FUST, garantindo a correta aplicação dos recursos não-reembolsáveis.

O que é o projeto Fust Escolas Conectadas?

O “Fust Escolas Conectadas” é a iniciativa prática, materializada por meio de editais, lançada pelo Ministério das Comunicações (MCom) e operada pelo BNDES para aplicar os recursos do fundo. Trata-se do programa que seleciona empresas de telecomunicações para executar os projetos de conectividade.

Um exemplo recente é o edital de maio de 2025, que destinou recursos para conectar escolas do campo com internet banda larga. O edital estabeleceu a meta de levar conexão de alta velocidade e redes Wi-Fi internas para 5 mil escolas públicas, priorizando aquelas em regiões de maior vulnerabilidade e sem conectividade adequada.

Requisitos técnicos e critérios de elegibilidade

Os editais do FUST são tecnicamente exigentes para garantir a qualidade do serviço. Não se trata apenas de levar um ponto de internet à escola, mas de assegurar uma conexão funcional para fins pedagógicos. Os requisitos geralmente incluem velocidades mínimas de conexão, muitas vezes calculadas por aluno (ex: 1 Mbps por aluno).

Além da banda larga, os projetos devem prever a instalação completa da infraestrutura interna, como a rede Wi-Fi, cobrindo todas as áreas de ensino. Outra exigência comum é o uso de medidores de qualidade independentes, como o SIMET Box (da Anatel/NIC.br), para monitorar se a velocidade contratada está sendo efetivamente entregue.

Quem financia o FUST?

O FUST é financiado pelas próprias empresas prestadoras de serviços de telecomunicações. As operadoras contribuem com 1% de sua receita operacional bruta, descontados os impostos.

Portanto, o fundo é composto por recursos do próprio setor que, pela nova lei, retornam à sociedade na forma de projetos de universalização. Essa contribuição é obrigatória e reverte-se em investimentos para áreas onde a operação comercial tradicional não é financeiramente viável, como é o caso de muitas escolas rurais.

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Oportunidades para ISPs com o avanço do FUST nas escolas rurais

A aplicação do FUST nas escolas rurais representa uma mudança significativa para o ecossistema de telecom, especialmente para os Provedores de Internet (ISPs). Os editais abrem um novo mercado para expansão de rede, financiado com recursos públicos não-reembolsáveis.

Quais são as oportunidades e desafios para provedores de internet (ISPs)?

Os ISPs, especialmente os de âmbito regional, são peças-chave para a execução dos projetos do FUST. Eles possuem a capilaridade e o conhecimento logístico das áreas rurais que as grandes operadoras muitas vezes não têm. Os editais do FUST Direto para conectar escolas representam uma oportunidade clara de negócio.

Oportunidades para ISPs Desafios para ISPs
  • Acesso a novos mercados: Conectar escolas em áreas remotas permite ao ISP construir uma infraestrutura (backhaul) que pode, futuramente, atender outros clientes na região.
  • Financiamento não reembolsável: O modelo do FUST financia a implementação, reduzindo o risco de investimento do provedor em áreas de baixa densidade populacional.
  • Impacto Social (ESG): Participar de projetos de inclusão digital fortalece a imagem da empresa e atende a critérios de responsabilidade social e governança.
  • Logística e custo: Levar fibra óptica ou instalar torres de rádio em locais de difícil acesso (sem estradas, com matas densas) é caro e demorado.
  • Manutenção: Garantir a estabilidade do sinal em áreas sujeitas a intempéries e com infraestrutura elétrica precária exige um plano de manutenção robusto.
  • Sustentabilidade: O projeto deve garantir a operação do serviço por um período determinado em edital, exigindo planejamento financeiro de longo prazo.

Soluções de conectividade viáveis para áreas rurais

Não existe uma solução tecnológica única para o campo. Os projetos do FUST devem ser flexíveis, utilizando a tecnologia mais adequada para cada realidade. A fibra óptica é a solução preferencial sempre que viável, garantindo as maiores velocidades e estabilidade.

Onde a fibra não chega, a conectividade via satélite (VSAT, LEO/MEO) tornou-se uma alternativa viável, com a nova geração de satélites de baixa órbita oferecendo latência reduzida. Além disso, soluções de Rádio Frequência, como o FWA (Fixed Wireless Access) usando tecnologias 4G e 5G no campo, são cruciais para cobrir as “últimas milhas” até as escolas.

Quais são as exigências para as ISPs atuarem no FUST nas escolas rurais?

Para participar dos editais, os ISPs precisam atender a diversas exigências que vão além da capacidade técnica de instalação. A principal é a garantia de manutenção: os contratos exigem que o provedor mantenha o serviço funcionando com qualidade pelo prazo estipulado.

Outro ponto crítico é a infraestrutura da própria escola. Muitas vezes, não adianta levar a conexão se a escola sofre com energia elétrica instável ou se não possui uma rede interna (LAN/Wi-Fi) adequada. Os projetos mais completos financiados pelo FUST preveem não apenas o link de internet, mas também a adequação dessa infraestrutura interna.

Entenda: Implementação da realidade aumentada na educação

Quais são os desafios futuros do FUST nas escolas rurais?

A implementação dos projetos de conectividade é apenas a primeira etapa. O verdadeiro desafio do FUST nas escolas rurais é garantir a qualidade contínua do serviço, o seu uso pedagógico efetivo e a sustentabilidade financeira desses projetos a longo prazo.

Garantindo a qualidade com fiscalização e monitoramento

A entrega da velocidade contratada é um ponto central. O BNDES e os órgãos reguladores, como a Anatel, utilizam ferramentas de monitoramento (como o SIMET) para auditar a qualidade do serviço.

Essa fiscalização é essencial para garantir que o recurso público está sendo aplicado corretamente. O monitoramento contínuo assegura que os alunos tenham, de fato, a conexão necessária para suas atividades, evitando que as escolas recebam apenas uma conexão para constar em relatórios.

Impacto esperado e a capacitação de educadores

O maior impacto do FUST nas escolas rurais será a redução da desigualdade educacional. Com acesso à internet, alunos podem usar as mesmas plataformas e recursos que estudantes de grandes centros, e professores podem acessar programas de formação continuada.

Contudo, a tecnologia por si só não gera aprendizado. É fundamental que os projetos de conectividade venham acompanhados de programas de capacitação de educadores. Os professores precisam de apoio para integrar as novas ferramentas digitais em seus planos de aula, transformando a conexão em conhecimento real.

Quais são os desafios para o avanço do FUST nas escolas rurais?

Garantir a sustentabilidade dos projetos após o término do contrato inicial é um dos maiores desafios. É preciso criar mecanismos para que a manutenção das redes e o custo da conexão continuem sendo cobertos, seja pelo FUST ou por outras políticas públicas.

Além disso, há um debate sobre a expansão do uso do fundo. Entidades como a ConectarAGRO defendem que o FUST não deve se limitar aos muros da escola. A infraestrutura criada para conectar a instituição de ensino deve servir como um “hub” para levar conectividade a toda a comunidade rural ao redor, otimizando o investimento e gerando desenvolvimento regional.

A imagem mostra um grupo de crianças em uma sala de aula moderna, concentradas em atividades com computadores portáteis.

Veja mais: Discrepâncias regionais de conectividade por serviços rurais e urbanos

Qual a importância do FUST para a transformação digital na educação?

A aplicação efetiva do FUST nas escolas rurais é um dos pilares centrais para a transformação digital da educação no Brasil. O fundo deixou de ser apenas uma reserva contábil para se tornar o principal mecanismo de financiamento da inclusão digital em áreas historicamente negligenciadas.

Para que o programa atinja seu potencial máximo, a colaboração entre o governo (MCom, MEC, BNDES), a iniciativa privada (ISPs e operadoras) e a comunidade escolar é fundamental. O sucesso dessa política pública será medido não pelo número de escolas conectadas, mas pela melhoria efetiva no aprendizado e nas oportunidades dos alunos do campo.

Para ficar por dentro do projeto FUST nas escolas rurais e de tudo o que acontece nas áreas de conectividade e inovação tecnológica, continue acompanhando o Futurecom Digital, o canal de conteúdo da feira Futurecom.

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