Professor titular de faculdades do Rio Grande do Sul, onde mora e trabalha, mestre em engenharia de produção e sistemas. O convidado para o Minutos Corporativos de hoje tem uma trajetória brilhante dentro da Calçadas Bibi, pioneira no segmento infantil.

Rosnaldo da Silva ingressou na empresa como vendedor, passou por várias funções e programas de formação até chegar ao cargo que ocupa atualmente, Diretor de Operações e Competitividade. 

Há mais de 25 no setor de calçados, nos conta tudo o que sabe e vive na Indústria 4.0. A reinvenção do setor calçadista para enfrentar os desafios do futuro. Fique com a gente porque o papo é muito bom!

Futurecom: Como a Calçados Bibi vem incorporando a inovação em seus processos do dia a dia?

Rosnaldo da Silva: “Normalmente os processos de inovação em empresas como a nossa, que trabalham servindo o consumidor, começam no relacionamento com os clientes ou a partir dos seus produtos. 

Na Bibi não foi diferente. Nós construímos um conjunto de inovações robustas em produtos que chegaram ao consumidor, e esses produtos criados com tecnologias diferentes que respeitavam a anatomia e a fisiologia do pé e o desenvolvimento da criança foram concebidos por desenvolvimentos em plataformas tecnológicas que tradicionalmente não eram utilizadas no setor calçadista. 

As nossas áreas de projeto alguns anos atrás já incorporaram tecnologias que hoje estão sendo interligadas com o conjunto de equipamentos que estão nas linhas de produção para desenvolvimento de projeto, e isso foi bastante inovador porque havia uma concepção no setor calçadista e de moda em geral de que os projetos deveriam ser feitos na prancheta como uma obra de um artista, um desenho em um papel que a partir daí seria transformado em um produto por um artesão. 

E hoje nós não temos mais espaço para isso porque uma das dimensões competitivas que constroem nossa estratégia é a velocidade, e não há como ter velocidade no processo se não investirmos em tecnologias de manufatura avançadas. 

Então acho que os primeiros movimentos da Bibi em tecnologia e de sua aplicação se deram dentro da concepção de produtos dentro das áreas de engenharia de projeto e design. Foi uma revolução tirar o artesão do desenho técnico e colocá-lo à frente de um CAD e dizer ‘você vai fazer design assistido por computador e depois vamos desenvolver manufatura por computação’. 

Isso foi uma revolução 15 anos atrás, e a partir desse momento esses processos foram evoluindo e hoje eles já estão dentro da manufatura e evoluindo para o varejo. Então se eu fosse dar um marco, essa foi a virada de chave na empresa.”

Futurecom: As empresas de forma geral tiveram que se reinventar durante a pandemia. Como foi a atuação da Bibi nesse período?

Rosnaldo da Silva: “A paralisação das operações, as situações que enfrentamos de trabalho a distância ocorreram de uma forma muito rápida. Nós recebemos notícia de nossos fornecedores da Ásia de que lá estava tudo parando, na China, pois temos algumas matérias-primas que vem de lá, e nós pensávamos ‘que loucura’, e isso em dezembro de 2019. 

E não imaginávamos que essa onda fosse chegar ao Brasil. Em fevereiro e março nós vivemos em poucos dias a paralisação completa das atividades da fábrica. Eu me recordo que viajei para nossa unidade da Bahia em 15 de março e lá já havia rumores de que iriam paralisar as escolas e atividade industrial, e foi o que aconteceu. 

E a gente se colocou em uma situação de perplexidade, porque jamais ao longo dos 72 anos da empresa havia tido uma paralisação por questões sanitárias. Nós tivemos que rapidamente reverter o quadro de operações, não tínhamos mais condições de operar nem na indústria e nem no varejo por alguns dias, as lojas fecharam, e nós voltamos todos os nossos esforços de vendas para o e-commerce. 

Nós já tínhamos uma plataforma bem desenvolvida de e-commerce, mas em poucos dias, eu diria que em 60 dias nós tivemos que reestruturar toda a plataforma, e chegamos a aumentar nosso volume de negócios nele em mais de 15 vezes, e isso trouxe um impacto na operação muito grande. 

E como eu disse, a velocidade é uma dimensões competitivas que nos norteiam, e rapidamente criamos uma estrutura de e-commerce dentro das plataformas, e existe todo um ecossistema que envolve a área de varejo, e nós tínhamos que manter a operação e chegar ao nosso consumidor mesmo durante a pandemia.

Então o período de pandemia, apesar de termos tido dificuldades no faturamento, de ter trazido uma série de desafios para serem transpostos na área industrial, tivemos que aderir a um programa de redução de jornada, as exportações no mundo ficaram prejudicadas, mas mantivemos o ânimo de chegar ao nosso consumidor pelo canal digital. E assim foi feito, e chegamos a celebrar sucessivos recordes neste canal de venda, e apesar do retorno à normalidade os números de e-commerce se mantiveram muito mais altos do que eram antes da pandemia.

E na área industrial nós vínhamos com projetos de desenvolvimento de novos layouts já com tecnologias aplicadas de simulação computacional, tecnologias que já são utilizadas dentro da manufatura avançada, e nós vínhamos escolhendo quando seria o melhor momento de parar as unidades, se nas férias, em como faríamos o processo para não comprometer o faturamento.

Quando nós tivemos a fábrica parada nós aceleramos o processo de simulação dos layouts e em 30, 45 dias nós implantamos um novo layout na fábrica da Bahia, e tivemos um salto de eficiência de mais de 18% da unidade. Então nós fizemos do limão uma limonada: melhoramos os nossos negócios no comércio digital e nossa operação industrial para quando retomar a normalidade chegar ao mercado com mais eficiência, qualidade e menor custo.

Foi e ainda está sendo um período muito difícil, mas foi também um período em que a empresa se reconstruiu bravamente e muito rapidamente.”

Futurecom: Você acredita que o setor calçadista está alinhado aos novos hábitos dos consumidores?

Rosnaldo da Silva: “Talvez o pessoal da Bibi Calçados que está escutando nosso papo possa ficar um pouco magoado comigo, mas eu acho que o setor industrial calçadista brasileira ainda caminha a margem, de um modo geral. 

Não estou falando que isso afeta todas as empresas, pois temos algumas que tem já um desenvolvimento tecnológico e manufatura 4.0 de uma forma bastante intensa, mas na grande maioria das empresas que estão dentro do cluster calçadista a gente não percebe esse movimento ou sequer uma estratégia concebida no sentido de buscar relacionamento com o consumidor. 

O setor calçadista brasileira ainda é dependente de canais de distribuição que na minha opinião destroem o valor, de posicionamento por preço baixo, e normalmente esse tipo de canal não procura desenvolver relacionamento com o consumidor, ele compete por preço. E para um setor que pretende se posicionar à frente do seu tempo, a competição por preço baixo nem sempre é o melhor caminho, eu reconheço que é um dos caminhos, mas temos outras formas de competir. 

Nós podemos criar marcas, desenvolvê-las e vender fora do Brasil. Nós podemos competir por design, somos um país que tem uma capacidade tremenda de criação. Nós podemos competir com conforto, com segurança, nós temos outras dimensões competitivas para explorar. E eu penso que a grande maioria das firmas que compõem o setor industrial calçadista brasileira ainda precisa amadurecer e evoluir muito no caminho da busca pelo relacionamento com o consumidor.

Basta ver que as grandes marcas brasileiras já fizeram esse movimento, a Bibi está hoje no varejo, e temos outras grandes empresas brasileiras que também já fazem isso. Então isso evidencia uma tendência de irmos para esse caminho, mas infelizmente a grande maioria das empresas ainda não está nesse caminho na minha modesta opinião.”

Futurecom: Você acredita que, se não estamos alinhados a esses hábitos, precisamos reproduzir algo?

Rosnaldo da Silva: “A grande maioria dos competidores que estão no mercado calçadista, não encontrando essa forma de encantar o consumidor e entender seus anseios e necessidades, acaba na vala comum de competição por preço.

Então quando você não consegue identificar qual é a proposta de valor aderente ao seu público, você acaba competindo por preço. E por que eu acho que competir por preço é um problema sério? Porque quando olhamos o contexto mundial da fabricação de calçados, 75% está na Ásia. Então com este volume, você imagina que 55% dos calçados produzidos no mundo hoje estão vindo da China, e outra parcela de 20% nos países asiáticos que estão em torno da China.

Como nós vamos ter a capacidade de competir por preço baixo com um gigante que tem escala? Evidentemente a gente pode, mas será uma tarefa difícil. Então nós como brasileiros temos que descobrir o que nosso consumidor quer, e a melhor maneira de fazer isso é estreitando o relacionamento hoje com o consumidor.

O consumidor hoje tem a loja nas suas mãos, tem os produtos nas suas mãos, ele compra pelo telefone, ele não se dirige mais sequer ao desktop para fazer as compras porque ele é mobile, então ele está com o celular. Então nossos produtos precisam estar acessíveis, e os dados, que tanto se fala na manufatura avançada, do Big Data e etc, são o novo petróleo nesse mercado.

É a partir do garimpo desses dados que vamos descobrir o que os consumidores estão aptos a consumir. É a partir do relacionamento com ele, de plataformas digitais, mídias sociais, de entender o percurso que ele faz no caminho de compra é que vamos descobrir produtos que estão aderentes em sua intenção de compra e valorização. 

Preço é valor, e precisamos criar produtos que tenham valor percebido pelo cliente, e não existe maneira de criar valor se não nos relacionarmos com o cliente. Infelizmente no setor calçadista ainda existem muitas empresas que terceirizam o relacionamento com o consumidor, e isso é um risco para a sobrevivência delas.

Eu vou dar um exemplo de uma barbearia local. Eu recebi uma mensagem da barbearia onde eu levo meu filho de 5 anos para cortar o cabelo. E a mensagem convidava ele para tomar um chopinho. Então isso mostra que não adianta termos dados, precisamos saber o que fazer com eles. O pessoal não sabe que o cliente dele tem 5 anos de idade [risos].”

Futurecom: Vocês possuem duas fábricas, uma no Rio Grande do Sul e outra na Bahia. Quais novas tecnologias foram implementadas em ambas unidades para garantir mais agilidade na produção?

Rosnaldo da Silva: “Nós temos tecnologias que estão implantadas no chão de fábrica, como tecnologias de produção, e nós temos tecnologias que estão servindo as áreas de engenharia nas áreas de planejamento e gestão da empresa. Normalmente essas últimas são mais custosas, exigem mais capital intelectual, e são administradas em parceria com terceiros.

Eu vou dar um exemplo: para efetuar o planejamento e o desenvolvimento de layout, que era uma das ferramentas que nós tínhamos para acelerar a produção da fábrica e reduzir custo, nós usamos a aplicação de um software da Siemens que produziu a simulação em ambiente computacional de toda a fábrica, mas não apenas a produção em 2D, mas uma simulação da fábrica em funcionamento.

Então temos todos fluxos de pessoas, de materiais, simulamos o fluxo de informação, então vemos a fábrica viva no computador, e fazemos as simulações que permitem saber se atendendo a demanda de produto A ou B, como se comportam os setores da empresa, onde se formam gargalos. 

Então vemos qual a melhor maneira de montar a planta para reduzir fluxos, diminuir estoques intermediários, entregar com mais velocidade e reduzir custos. Então isso foi simulado pela engenharia junto com uma consultoria que contratamos chamada Produttare, e trabalhamos a quatro mãos nisso.

Então é algo que exige da gestão alta capacidade de conhecimento, então precisamos ter engenheiros e profissionais muito bem formados nesse tipo de situação. E temos outras tecnologias que já estão sendo aplicadas dentro da fábrica para conferir velocidade e redução de custo.

Vou dar o exemplo, e cito nossos parceiros porque somos uma empresa de 72 anos e temos fornecedores que mantemos desde nosso primeiro mês de operação até hoje. Nós temos um fornecedor que é a Tintas Killing e que atua em dois segmentos: adesivos industriais e tintas.

Ela opera muito no Sul do Brasil. Nós tivemos um problema no ano passado com um fornecedor italiano de tintas que saiu do Brasil e ficamos sem cobertura para esse tipo de fornecedor. Naquele momento foi necessário desenvolver um processo inovador para o abastecimento de tintas para a área serigráfica, de impressão.

Nós não tínhamos nenhum fornecedor na planta da Bahia para suprir esse material. E nós convidamos a Killing para um projeto inovador de desenvolver um sistema tintométrico, e eles já tinham competência isso porque na construção civil você pode escolher a tinta no catálogo de cor para sua casa e eles fazem na máquina.

E isso era possível também de ser feito no setor calçadista, mas nossos volumes são pequenos, diferentes de consumidores que compram vários litros para construções. Nós falamos de testes de aplicação de tintas de 50ml, então não havia equipamento que tivesse precisão para um produto tão pequeno.

Nós chamamos a Killing, ela chamou seu parceiro que é um fabricante italiano de máquinas, e nós desenvolvemos juntos um equipamento tintométrico associado a um fotoespectômetro que nos permitiu desenvolver essas tintas dentro de casa a partir de 12 cores básicas, formando diversas tons, e com uma velocidade que nós não tínhamos antes.

No processo anterior o estilista imaginava a cor para o produto, então ele pegava a peça, ou a cor de pantone, levava ao fabricante, que fazia a amostra, mandava, fazíamos o teste, se aprovado ia para o setor de compras, que realizada a aquisição e então mandamos do Rio Grande do Sul para a Bahia.

Com essa tecnologia que nós adotamos em parceria com a Killing, o operador que está lá captura a imagem da peça que queremos reproduzir a cor, por tecnologia isso chega ao fornecedor, que desenvolve a tinta e programa pela sua unidade a nossa máquina planta da Bahia, a 3 mil quilômetros de distância. E eu imprimo o material na cor que eu quero.

Isso acelerou o processo de desenvolvimento e produção, reduziu minhas perdas porque não tenho mais sobras e descarte de tintas, então é bom para o meio ambiente, rápido e inteligente. Isso não existia na indústria calçadista, nós fomos os primeiros, e hoje ele está homologado em algumas marcas internacionais de grande reconhecimento, mas nasceu em um processo colaborativo.

Então a inovação na Bibi parte de um modelo colaborativo. Nós temos um processo de integração entre as equipes com fornecedores e clientes. Esse é um exemplo, mas teríamos outros tantos.”

Futurecom: Como funciona o processo de sensorização dos equipamentos? De que forma a automação tem impactado os negócios da Bibi?

Rosnaldo da Silva: “Nós temos duas situações: dentro do varejo existe toda uma inteligência desenvolvida para capturar a partir do comportamento do consumidor as tendências e preferências de compra quando ele acessa nosso site e navega, olha produtos, então conseguimos mensurar quais produtos que ele tem mais interesse, onde há rupturas.

Então temos robôs e pessoas trabalhando no sentido de fornecer dados adequados para a área de desenvolvimento de produtos, fazer a gestão de seus lançamentos, lançar produtos que estejam sendo demandados, ou mesmo reforçar os estoques das lojas físicas, pois o e-commerce também fornece informações para abastecer elas, há uma integração entre os canais.

Aí existe toda uma inteligência na parte de captura, tratamento e segurança dos dados, que são pilares da manufatura avançada e que precisam ser tratados. Na parte industrial nós também temos situação com tratamento de dados para fornecer condições para que tudo se integre e desenvolva soluções que satisfaçam as demandas do consumidor.

No varejo o tratamento de dados e segurança da informação são mais evidentes hoje. Nas indústrias nós estamos trabalhando na sensorização de máquinas e Internet das Coisas (IoT). Antigamente tínhamos uma série de processos que eram feitos de forma manual, por humanos, você passava nas máquinas, fazia o check list, e hoje não, as máquinas estão sensorizadas. 

Então eu tenho no laboratório um painel de controle e as pessoas só checam se há uma anormalidade, pois o sistema avisa se a temperatura ou algo de uma máquina está alterada, então a manutenção já entra em ação. 

Portanto a sensorização das máquinas caminha agora para um nível mais avançado em que as máquinas entre si estarão conversando e fazendo análise do trabalho que sai de uma e é recebido pela outra, e oferecendo condições para os líderes e facilitadores intervirem no processo apenas quando necessário, e ficarem à disposição da empresa para atender consumidores, cuidarem do negócio. 

Eu digo que não temos um sistema de produção, temos um sistema de negócios em que uma das partes é a produção.”

Futurecom: Quais são os planos de vocês para os próximos anos em relação às novas tecnologias?

Rosnaldo da Silva: “Nós estamos com um projeto de automação avançada para as áreas de costura da empresa, porque esse é no setor calçadista normalmente o maior gargalo, quando as empresas não trabalha com full plastic, com produtos como nós que são mais manufaturados, então normalmente o setor de costura é o que mais traz dificuldades para a produção.

Então nós estamos adotando uma tecnologia apoiada em um fabricante que tem tecnologia desenvolvida em Israel e que tem equipamentos de costura que hoje nos permite o desenvolvimento de costuras completamente automatizadas, com leitura de código RFID. Então o produto chega na máquina com o código, ela já sabe o que vai costurar e se auto regula para costurar aquele produto. 

Como temos muita diversidade de produto e baixa escala de produção, nós mudamos muito os produtos ao longo de um dia de produção. então as máquinas já tem condição de fazer a identificação e o grande diferencial este equipamento é que ele já vem com tecnologia embarcada para poder conversar com as máquinas, como as que estão na área de desenvolvimento.

Então hoje o estilista desenvolve o produto no seu CAD, ele manda isso para ser desenvolvido na máquina, e simultaneamente já conversa com a máquina que vai fazer a operação. Então enquanto estão desenvolvendo o produto, eu já estou fazendo a parte de ferramentas da produção. Quando eles liberam o produto para a produção, a máquina já recebe a informação do que vai produzir.

E essa tecnologia não encontramos nem em produtos chineses e nem em alemães, então nos dedicamos a comprar essa tecnologia isralense. Já estamos com duas ou três máquinas assim trabalhando, e todo nosso investimento dos próximos três a quatro anos será em automatizar plenamente a área de costura.”

Futurecom: Esse processo que você comentou que vai desde o estilista até o final, em quanto tempo ele levará para ser otimizado?

Rosnaldo da Silva: “Hoje temos condições de desenvolver um produto e entregá-lo para a produção em duas ou três horas, se os componentes básicos do produto estiverem prontos, se eu não precisar desenvolver por exemplo ferramentaria pesada para a injeção de solados.

Se eu for construir uma nova versão para aquilo que eu já trabalho em poucas horas já estará disponível para produção. Agora o grande barato disso é imaginarmos que no futuro próximo o estilista poderá estar na loja. Ele vai ser o seu filho, que talvez vá lá na nossa loja, e no computador da loja ele vai pegar o produto que eu já tenho e vai decorá-lo com uma estampa que ele ache bacana, com uma costura diferente que ele queira ou com seu nome bordado.

Hoje já fazemos isso com o cliente digitando no site, ele quer comprar seu primeiro Bibi com o nome do filho e pode colocar lá. Quem sabe em um futuro próximo poderemos fazer com que o consumidor customize seus produtos em massa, e é para isso que a tecnologia está lá, não só para melhorar a velocidade, mas para trazer experiência agradável ao consumidor na loja física.

A loja física precisa promover uma experiência diferente, e a manufatura está aqui para servir a área de marketing para atender o consumidor, então tudo que pensamos em tecnologia nós olhamos para fora com o objetivo de encantar o consumidor. Esse é o desafio dos nossos engenheiros.”

Futurecom: É possível combinar Indústria 4.0 e sustentabilidade?

Rosnaldo da Silva: “É possível e cada vez mais necessário. Nós temos um reconhecimento da própria Bibi Calçados relacionado com nossa operação em nível de sustentabilidade, e as entidades fazem um trabalho de reconhecimento das empresas que estão dentro do setor que trabalham com sustentabilidade.

Dentro da nossa linha de produtos nós temos como compromisso não utilizar nenhum produto tóxico. Infelizmente isso no Brasil não é uma coisa muito comum, e existem uma série de substâncias que não devem ser utilizadas, e o Brasil não tem regulamentação para isso ainda, então o setor calçadista pode utilizá-las, assim como o de confecção.

Mas nós seguimos normas internacionais que regulamentam o uso de substâncias restritas e tóxicas ao contato com humanos, e todos nossos produtos são isentos delas. E essa é uma preocupação social, apesar de ela trazer o impacto econômico para a empresa, pois nós pagamos mais evidentemente por esses produtos.

Nós temos uma série de medidas dentro da empresa que visam um compromisso, eu diria até que hoje nós respeitamos o modelo triple bottom que fala de social, ambiental e econômico. 

Mas nós hoje estamos nos dirigindo para um pensamento que inclui uma quarta dimensão no modelo tradicional de sustentabilidade, que é o modelo de competitividade sustentável, que é assumir um compromisso em gerenciar e melhorar os nossos resultados econômicos dentro da empresa, nossos impactos ambientais e as implicações que isso tem na operação, mas preservando a cultura da organização. 

Isso não é uma coisa fácil, pois isso precisa ser feito de forma local, nacional e internacional onde atuamos, mas temos um firme propósito de competir de forma sustentável, e estamos inclusive revendo agora, discutindo nossa missão e visão, e buscando rever nosso propósito, que nos próximos dias lançaremos uma campanha sobre isso, nos colocando como uma empresa que tem um compromisso com sustentabilidade.

Nós não podemos confundir sustentabilidade com filantropia, caridade, mas temos uma série de ações que procuramos trabalhar na área de desenvolvimento de produto. Um de nossos indicadores está ligado à redução da geração de resíduos industriais em todos os seus níveis, desde a água que consumimos até o resíduo que é desenvolvido a partir da atividade industrial.

Nós fomos a primeira empresa calçadista brasileira a conseguir junto com uma empresa italiana transformar aparas de couro, que é chamado de resíduo classe 1, que precisa de uma série de cuidados em função do couro ser curtio a base de cromo, que é um metal pesado e que se ingerido por animais ou pessoas ele se mantém na corrente sanguínea fica acumulado, então precisamos ter muito cuidado com o descarte. 

Então desenvolvemos essa parceria e conseguimos fazer a remoção do cromo dessas aparas, porque se promovermos a incineração desse material não conseguimos retirar o cromo, então essa tecnologia retira o cromo, que pode ser aproveitado em outras atividades, e o residual desse processo de transformação serve como adubo orgânico utilizado em lavouras da Europa, porque no Brasil ainda não existe regulamentação para esse processo. 

Nós produzimos a partir do nosso resíduo um fertilizante orgânico que vai ser exportado por uma empresa multinacional italiana gerando divisas para nosso Brasil a partir de exportação a partir de um produto que seria coprocessado. Então nós temos uma preocupação muito grande com sustentabilidade, falamos nisso e temos ações. 

Essa ação pode parecer pequena, mas é extremamente complexa, envolveu muito esforço, e hoje faz disso uma atividade econômica, gerando empresas e gerando exportação, então é uma coisa fantástica.”

Futurecom: Se você pudesse conversar com alguém no âmbito pessoal ou profissional, com quem falaria?

Rosnaldo da Silva: “Eu por ter formação em engenharia de produção sempre fui um admirador de várias personalidades que construíram a engenharia de produção no mundo. 

Mas teve um cara que eu não pude conhecer, que foi o Taiichi Ohno, que foi um dos grandes pensadores e engenheiros da Toyota. Ele concebeu todo um sistema de produção que conseguiu trabalhar com alta diversidade de produtos e baixa escala de produção em um mercado que havia sido destruído na segunda guerra mundial, que foi o mercado japonês, e esses caras reconstruíram uma empresa, e ele concebeu um dos sistemas de produção mais reconhecidos, estudados e perseguidos dentro das empresas. 

E ele fez tudo isso em um momento em que o nível de informatização das empresas era parco, era quase inexistente, a tecnologia da informação estava nascendo no pós-guerra, então nós vivíamos em um mundo analógico. Ele transformou o mundo vivendo em um mundo analógico.

Meu sonho era poder conversar com ele, inserido nessas mudanças todas que estamos, porque eu nasci analógico e estou tentando me transformar em digital. Eu nasci na época em que o telefone era para poucos, o telefone em casa era declarado no imposto de renda, e hoje nós temos crianças com tecnologia da informação, celulares na mão, fazendo aulas a distância, treinamentos a distância, Realidade Aumentada nas fábricas.

Eu queria poder conversar com o Taiichi Ohno e ver como ele ia administrar e se transformar para receber todas essas inovações.”

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