O Minutos Corporativos de hoje é com Antonio Valadares, gerente de Tecnologia da Informação do Hospital Israelita Albert Einstein. O Albert Einstein é um dos principais hospitais da América Latina, e foi classificado como o 38º hospital do mundo. 

Antonio, com sua expertise de mais de 20 anos no setor de saúde, vai nos falar sobre o efeito das transformações digitais na área. Como a evolução da transformação digital e o uso da Inteligência Artificial muda a relação entre as instituições de saúde? 

Como é no Einstein? Você sabia que para ter uma transformação digital é preciso ter uma transformação de mindset?

Futurecom: Quais as principais mudanças que a transformação digital associada à ciência de dados está promovendo na área da saúde?

Antonio Valadares: “Falar de transformação digital é um assunto muito amplo. Transformação digital não fala só de tecnologias, fala de comportamento, de mudança de mindset e forma de trabalho das pessoas. Logico que passa bastante pela tecnologia, mas passa muito mais pela mudança na forma de trabalho. 

E associada a toda essa questão da ciência de dados e de analytics, isso traz uma agilidade na interpretação e na identificação de problemas que na prática quando você depende de processos humanos e pessoas lidando com aquelas situações, fica muito mais moroso. 

A produtividade, a ciência de dados associada à transformação digital, e tudo isso ligado ao processo operacional da empresa traz muita agilidade. Eu acho que vale a gente falar um pouco dessa jornada da transformação digital, que já vem acontecendo há algum tempo mas que de dois anos para cá, principalmente pela pandemia, as empresas tiveram que acelerar muito nesse processo de transformação.

A demanda por serviços mais digitais e com maior valor agregado fez com que as empresas precisassem mudar rapidamente o mindset das pessoas, com mais agilidade e buscando entregas de maior valor agregado para o cliente final, no nosso caso seja ele paciente, médico, aluno, pois nós temos uma vertical de ensino muito grande, e claro, para o colaborador e funcionário do Einstein. Isso buscando sempre maior encantamento da entrega para o usuário final.

As preocupações com qualidade e experiência do usuário, seja ele paciente, médico, aluno ou funcionário, são tão latentes dentro do Einstein que nós criamos centros de excelência de qualidade, teste, agilidade, experiência de usuário a fim de garantirmos um melhor VPM, uma melhor entrega, e consequentemente fazer com que o usuário final se encante com o que foi entregue.

Estou falando seja de programas, de projetos, de novos processos que são remodelados na instituição, pois a transformação digital não está somente ligada à tecnologia, mas ao processo e melhor experiência. Essa nova realidade do mercado ela traz pra dentro da organização onde os times trabalham de forma cada vez mais matriciais, permitindo quebras de silos, desenvolvendo soluções e caminhos estruturantes para que as soluções deixem de ser setoriais e passem a ser estruturantes, corporativas e reutilizáveis por todos os setores.

Até agora eu não falei muito de tecnologia, estou falando mais de comportamental e processo, mas vou chegar lá. Falei de quebra de silos, e vou falar de trabalho colaborativo e construtivo. Antes, não muito tempo atrás, os processos dessa empresas eram muito focados em cima do indivíduo. 

Essa nova realidade de trabalho, de transformação digital e agilidade, ela preza muito por um trabalho colaborativo e construtivo, onde o indivíduo perde um pouco de espaço e o que ganha mais valor é a coletividade, gerando aumento de sinergia e produtividade entre os múltiplos times que trabalham em conjunto, sejam eles técnicos ou da área de negócios.

Do ponto de vista da tecnologia, nós aqui no Einstein temos seguido por uma jornada, e lógico com toda segurança da informação, LGPD, de cloud. Desde serviços, plataformas, buscando agilidade e não vou nem comentar redução de custos, pois às vezes a cloud não reduz custo. 

Infra por infra não reduz custo, pois se você for ver tudo que está por trás para você disponibilizar uma infra on premise, desenvolver internamente um serviço ou produto, se você o utilizar na cloud e for ver todo esse contexto, é claro que a cloud talvez gere um custo parecido. Quando a gente fala em cloud a gente não pode pensar em custo, mas sim em agilidade, em entregar mais rápido.

Implementação de ferramentas DevOps, com muita segurança, permitindo mais celeridade na construção de pipelines de desenvolvimento, entregas constantes, aumento do nível de qualidade das entregas, de exigência, que passou a ser de suma importância nas squads de desenvolvimento. Por isso os DevOps junto com testes de qualidade, passando a squad a ser medida por métricas de produtividade.

Na prática para a instituição toda essa mudança de comportamento, vamos chamar de soft skills, e toda a mudança tecnológica, o resultado final é uma jornada que reflete uma melhora no tratamento do atendimento ao cliente final. 

Falando um pouco de advanced analytics ligado à transformação digital, aqui no Einstein a gente é uma empresa que investe muito em tecnologia. Então a cultura do advanced analytics, de Inteligência Artificial, já está bem enraizada no nosso dia a dia. 

Nós temos alguns exemplos que temos atualmente implementados dentro do fluxo operacional, por exemplo otimização no processo de auditoria de contas de fontes pagadoras. Antigamente nós tínhamos um número grande de funcionários, a partir do momento que implementados o sistema de IA para automatizar o processo de pagamento de contas nós tivemos maior produtividade, assertividade, menor tempo da liberação das contas para o hospital, e tudo isso com uso da IA e vários algoritmos por trás.

Identificação de possível piora no estado clínico do paciente. Então a IA ligada ao processo de tratamento do paciente, com algoritmos inteligentes acompanhando tudo isso, que é outro exemplo de transformação digital e IA trabalhando juntas. Otimização de salas cirúrgicas, buscando maior produtividade. 

Há pouco tempo implantamos um outro sistema onde o próprio médico de sua cínica pode acessar o nosso sistema de agendamento de cirurgias e através de um algoritmo que criamos ele vê a melhor opção de agenda por ele para aquela cirurgia, onde são levadas considerações como tempo da cirurgia, tempo médio daquele médio naquele tipo de cirurgia, e no final isso traz uma otimização do centro cirúrgico. A gente  tem maior disponibilidade de salas, na prática a gente evita alguns investimentos em novas salas por esse processo de otimização.

Outros exemplos são a indicação de probabilidade de internação do paciente, com entrada no PA, são capturados alguns parâmetros e o algoritmo roda identificando se aquele paciente tem probabilidade ou não de ser internado. Isso gera otimização na gestão de leitos, dispara vários fluxos para médicos, para o setor administrativo, para fazer liberação de leito, limpeza antecipada. 

Agilidade na admissão do paciente e check-in automático através de identificação facial, leitura de pedido médico através de OCR. Imagina o médico pedindo trinta exames, e para um atendente digitar tudo isso demora muito tempo. Então estamos implementando uma solução em que o OCR lê essa estrutura, já lança diretamente no pedido paciente e agiliza, sendo mais uma ação de aumento de produtividade.

Pelos exemplos dados, a gente vê que existem múltiplas mudanças em mudança, soluções aplicadas e espalhadas pelos diversos setores da instituição, trazendo maior segurança para o paciente, maior agilidade no atendimento, maior produtividade para a instituição e consequentemente otimização de custos.”

Futurecom: Com a evolução da transformação digital e o uso da IA, o que vai mudar na relação entre as instituições de saúde? E entre elas e o público, o que muda?

Antonio Valadares: “As mudanças podem ser enormes e diversas. Mas nem todos estão no mesmo ponto de transformação digital. Conforme eu falei, a transformação digital é muito menos tecnológica e muito mais de mudança de mindset. Seja do ponto de vista de mudança comportamental ou do ponto de vista tecnológico, nem todos estão no mesmo ponto. 

Mas as empresas podem buscar em conjunto, e com foco no paciente, uma maior qualidade no atendimento sem aumento de custo. E às vezes até redução do custo da saúde, que é um dos grandes calcanhares de Aquiles atualmente do setor. Podemos dar alguns exemplos, que são coisas que já estamos trabalhando, como a relação entre os prestadores de serviço, hospitais, e fontes pagadoras. 

Através da IA é possível por exemplo agilizar a liberação de contas para pagamentos através de algoritmos, esse é um projeto que implementamos há três ou quatro anos. Esse algoritmo avalia a evolução clínica que o médico faz diariamente do paciente, e eventualmente as áreas não lançam todos os itens para serem cobrados das fontes pagadoras, ou lançam até por erro algum item a mais. 

Então passamos esse algoritmo na evolução da enfermagem, que são textos, e através da IA nós lançamos itens faltantes ou removemos itens lançados desnecessariamente. Isso agiliza muito o processo de liberação de conta, e consequentemente é bom para o hospital, pois agiliza o fluxo de caixa.

Outro exemplo que posso comentar também está na relação de fontes de pagadores e prestadores. É possível por exemplo o compartilhamento dos resultados de exames entre os diversos prestadores de uma rede credenciada, possibilitando dessa forma uma melhor gestão da saúde do paciente, otimizando custos da operadora, e através de algoritmos aplicados na base de dados identificar por exemplo doenças previamente e iniciar o tratamento no início, e isso na prática reduz o custo, pois quanto mais cedo você identifica uma doença você trata mais rapidamente, libera o paciente mais rapidamente e o desfecho é mais positivo.

Entre a relação de pacientes, prestadores e médicos, na minha visão e pelo que vejo no hospital cada vez mais o paciente se empodera de seus dados clínicos, e ele entende que é o dono da informação, de seu prontuário, e que ele pode compartilhar suas informações com outros hospitais e outros médicos. E aí vem a transformação digital e tecnologia para facilitar esse compartilhamento entre companhias. Claro que tudo ligado, regulamentado pela LGPD, mas do ponto de vista tecnológico, é um caminho de mudança no comportamento das empresas de saúde com o paciente no meio de tudo isso.”

Futurecom: Você acredita que isso humaniza os procedimentos?

Antonio Valadares: “Para as pessoas que já vieram ao Einstein, o hospital não quer que tenha uma cara de hospital, mas sim humanizando. A pessoa tem que entrar e se sentir acolhida, e a gente trabalha muito para isso. E o humanizar, quando as operadoras e as prestadoras de serviço começam a trabalhar de forma colaborativa, sim, o foco passa a ser o paciente, a vida dele.

Então eu acredito que o paciente passa a ser tratado de uma maneira mais abrangente, então ele não precisa ficar indo no hospital A, B ou C para refazer alguns exames ou procedimentos. Você tendo ele no centro, o tratamento pode ser contínuo, e o desfecho pode ser muito melhor. E o resultado final também. E claro que por trás de tudo isso tem tecnologia, transformação digital, IA, propiciando toda essa integração e conectividade entre os diversos players da área de saúde.

Nossos pacientes são de longa data. Temos pacientes que vem aqui e todo o histórico de procedimentos, passagens, admissões que foram feitas no hospital já estão no prontuário eletrônico. Tem gente que nasceu aqui e hoje está fazendo tratamentos, e o médico consegue ver todo o histórico do paciente. 

E isso é uma preocupação que nós temos com o desfecho, com a qualidade de vida e a saúde do paciente. Você vir aqui e saber que seu pai já passou por aqui em algum momento, que você está com algum problema e que pode ser algo genético, a gente consegue na prática avaliar tudo isso. E acho que cada vez mais, quando o governo perceber isso, ele irá perceber que podem tratar muito melhor a população, pois tem a saúde pública que tem um custo extremamente alto. 

A partir do momento que o governo consegue fazer todo esse acompanhamento do paciente desde o início, e aí é preciso trabalhar com que todos os players que prestam serviços para o SUS tenham uma base única, e a partir dali será possível trabalhar com todos esses dados, podendo dar uma qualidade de vida e um tratamento muito melhor para o paciente, e com custo menor.”

Futurecom: Há muitas mudanças na forma de trabalhar pelos profissionais que atendem diretamente o público?

Antonio Valadares: “Sim. Tanto os colaboradores do Einstein, sejam enfermeiros, times de backoffice, de atendimento e linha de frente, quanto o próprio paciente. Além dos exemplos citados de indicadores de probabilidade de internação, isso é uma mudança de comportamento muito grande.

Hoje na prática existe um time que faz a gestão de leitos da instituição. Eles já tem previamente a identificação e o apontamento de que um determinado paciente tem 90% de chances de ser internado, e isso dispara vários processos internos. E inclusive até o paciente percebe, porque imagina que você tenha um leito disponível. 

Com todo esse plano já é feita a mobilização para a liberação de leito, ou um paciente está prestes a sair em alta, e você pode colocar ele em outro lugar de acolhimento e já liberar o leito para outro paciente, isso já é mudança na forma de trabalho. 

O exemplo do OCR que é muito utilizado na central de exames, o tempo que teria para um atendente digitar 30 exames, então agora é que se passe no scanner, ele leia o que está digitado, e lance automaticamente, e o tempo de atendimento será muito mais rápido.

Nós estamos indo para uma linha de auto-atendimento. Nós temos alguns totens com os quais temos trabalhado fortemente, e a forma de trabalho é a seguinte: o paciente chega na unidade, se identifica através do CPF, ou faz um reconhecimento facial, e faz seu auto check-in. 

No momento que ele fizer isso, já está tudo agendado no sistema, ele imprime as etiquetas e já redireciona para o setor. Nesse momento já é feita uma chamada no consultório via SMS ou painel, e o atendente já está ciente que o paciente fez o check-in dele. 

Outro exemplo é o de que há pouco tempo nós começamos uma nova linha de negócios com atendimentos nos aeroportos pela questão da Covid, então o paciente se identifica da mesma forma, escolhe o produto, no caso PCR, a etiqueta é impressa e ele já faz o pagamento pelo pin pad no próprio totem. 

E da mesma forma são enviados SMS, já é avisado ao time de backoffice que o paciente está disponível, e ele logo é chamado para a coleta do exame. Tem outro serviço que é Einstein até você, que é o processo de desospitalização, que é a tendência de levar o hospital até a casa do cliente. 

A gente otimizou fortemente o trabalho do backoffice, pois antes eles tinham que preparar todo o processo de coleta de exames, toda a parte burocrática. Então hoje tem um tablet que o atendente vai com ele à casa do paciente, bipa o paciente, faz o processo de identificar que foi coletado o exame, e o que é mais interessante é que antes o time voltava com um monte de trabalho, mas agora quando ele bipa e avisa que o exame foi coletada já automaticamente são preparados os próximos processos. 

E em alguns casos, se for particular, o paciente já paga direto no pin pad e o recibo já vai automaticamente para o email dele, então é um processo que foi super otimizado. Tem vários exemplos que podemos citar, como a ferramenta de agendamento de centro cirúrgico que comentei, que reduziu o trabalho interno, pois o próprio médico já faz.

De forma geral estamos tentando levar maior agilidade, maior encantamento para o público final, e com redução de custos e otimização de investimentos.”

Futurecom: Entre tanta coisa dita, o que ainda podemos esperar do Albert Einstein no futuro próximo?

Antonio Valadares: “Quem trabalha no Einstein é encantado com a empresa, e quem trabalha aqui dentro procura dar o melhor de si, porque a gente sabe que no fim de tudo isso tem um paciente, ou um aluno, que é um médico.

O Einstein preza muito pela qualidade com que trata seus pacientes. Temos uma preocupação extrema com o cliente final. Queremos sempre que ele seja muito bem tratado e que tenha um desfecho muito feliz no seu atendimento, e claro que a tecnologia faz parte dessa jornada e é uma das formas da gente garantir uma maior humanização e satisfação grande do paciente.

E por isso temos que estar sempre olhando o futuro, o que tem de novo. Eu vou dar dois exemplos de atividades que estamos em busca. Uma é a utilização de wearables para implementarmos uma jornada de acompanhamento do paciente desospitalizado, ou até hospitalizado, mas estamos buscando um case que gere uma melhor experiência e adoção por parte do paciente, e que consequentemente traga um resultado positivo para o processo hospitalar.

Quando pensamos em transformação digital não é só colocar o dispositivo junto ao paciente, mas sim ter uma boa jornada para aplicá-lo. E outro ponto que temos fortalecido muito está ligado à mobilidade, de forma que o paciente tenha seu prontuário eletrônico e o serviço da instituição na palma da mão. 

Hoje temos o Meu Einstein, que é o aplicativo, e queremos que ele tenha toda a facilidade possível para interagir com o hospital, seja em agendamento, histórico de vacinas, ou até acompanhar a internação de um ente, então é o conceito do Einstein na palma da mão.”

Futurecom: Se você pudesse conversar com alguém no âmbito pessoal ou profissional, com quem você falaria?

Antonio Valadares: “Primeiro é com quem eu já falo: meu pai, minha mãe, minha esposa, meus filhos, com Deus. Mas eu poderia te responder de várias formas, Steve Jobs, Bill Gates, porque eu sou de tecnologia, mas vou tentar sair do lugar comum. 

Eu gostaria de ter conhecido e conversado com o Stephen Hawking, o cientista, que teve ELA, e é uma pessoa que viveu até os 76 anos e essa doença na verdade não dá um grande tempo de vida para o paciente, eu sei porque minha sogra teve, e ele conseguiu criar muito do ponto de vista da ciência. 

Ele é uma pessoa extremamente inteligente, e mesmo com seu problema ele fez muito pelo mundo da saúde. E na prática ele conseguiu estimular várias pessoas a pensar fora da caixa sem perder a simplicidade dele de interiorano lá da Inglaterra. Acho que menos é mais, acho que simplicidade é tudo, e eu gostaria de ter conhecido ele.”

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