A corrida das empresas pela nuvem no Brasil segue um caminho próprio. Diferente de outros países, onde poucos concorrentes concentram a maior parte da receita do mercado, no Brasil o crescimento é pulverizado, impulsionado por provedores de cloud computing regionais que, embora tecnicamente conseguem atender clientes de Norte a Sul, acabam concentrando o faturamento em empresas estabelecidas nas suas regiões.
De acordo com pesquisa Panorama da Nuvem da Abracloud, 16% dos provedores de serviços de computação em nuvem têm mais de 100 colaboradores, e 73% dos provedores são empresas médias (34% tem até 9 colaboradores e 39% tem de 10 a 49 colaboradores).
Essa característica regional do consumo de cloud computing é impulsionada pela conectividade, como fatores de latência e densidade de telecomunicações na região; além de cultural, como é o caso dos provedores de serviços IaaS gerenciados. Por outro lado, esse cenário também cria um efeito colateral: o gargalo da mão de obra especializada.
Com estruturas médias de 97 colaboradores, e quase metade desses colaboradores em departamentos de engenharia e operações, os provedores regionais de computação em nuvem enfrentam pressão constante para atrair e reter talentos.
O desafio da contratação local
A maior parte dos provedores ainda mantém a exigência de contratação de mão de obra presencial. Isso gera impactos diretos, como a oferta limitada de profissionais especializados em determinadas localidades e a concorrência acirrada entre provedores de cloud computing que disputam os mesmos talentos.
Adiciona-se a pressão de empresas de tecnologia estrangeiras que têm contrato no Brasil para trabalho remoto no exterior.
Além dos custos inflacionados quando a demanda supera a disponibilidade, a consequência é uma barreira clara ao avanço do mercado nacional de provedores de nuvem: O limite imposto pela falta de profissionais qualificados.
O novo cenário do trabalho remoto
Por outro lado, a força de trabalho aponta em outra direção. Dados do Google Trends revelam que buscas por “home office”, “trabalho remoto” e “vaga remota” seguem elevadas no Brasil, com os maiores picos desde a pandemia.
Enquanto empresas do mercado tradicional têm reforçado o discurso do presencial, os profissionais seguem em outra direção. A justificativa costuma girar em torno de ganhos de produtividade, maior colaboração entre equipes e fortalecimento da cultura organizacional, o que demonstra um viés claro de grandes empresas.
Porém, a maior parte dos provedores nacionais são médias empresas; profissionais de tecnologia valorizam a flexibilidade conquistada nos últimos anos e essa condição já pesa tanto quanto salário ou cargo na hora de escolher uma vaga.
Esse descompasso cria uma oportunidade estratégica. Os provedores regionais de serviços IaaS, que tradicionalmente sofrem mais com a restrição geográfica, podem transformar essa limitação em vantagem competitiva.
Oportunidade para os provedores nacionais de cloud computing
Ao adotar o trabalho remoto, os provedores regionais de cloud rompem barreiras geográficas e, assim, alcançam talentos em qualquer parte do país. Além disso, conseguem atrair especialistas que preferem a flexibilidade do home office ao retorno presencial.
O modelo, por sua vez, também permite diversificar as equipes, reunindo experiências de diferentes regiões. Ainda possibilita escalar operações de forma sustentável, sem a pressão dos altos salários locais. No fim, essa mudança não apenas amplia a capacidade de entrega, mas também reforça a competitividade dos provedores IaaS no cenário nacional.
Impactos no ecossistema de nuvem
A contratação remota vai além de resolver o problema de cada provedor: ela fortalece toda a cadeia. Para os provedores, isso significa maior resiliência e acesso constante a competências críticas. Já para os profissionais, representa a ampliação dos horizontes de carreira, permitindo equilibrar vida pessoal e desenvolvimento técnico.
Por fim, para o setor como um todo, a prática torna o ecossistema mais robusto, capaz de superar barreiras geográficas e reduzir a dependência de multinacionais.
O caminho possível
A discussão sobre modelos de trabalho deixou de ser apenas um tema de gestão de pessoas. No setor de computação em nuvem, tornou-se um fator estratégico de sustentabilidade e crescimento.
Enquanto as big techs intensificam a volta ao escritório, os provedores nacionais têm a chance de ocupar um espaço único: oferecer flexibilidade, atrair talentos especializados e sustentar a expansão do mercado de nuvem no Brasil.
Assim, ao adotar o remoto, os provedores deixam de estar em desvantagem geográfica e passam a construir um caminho mais conectado às expectativas da nova força de trabalho. E esse pode ser o diferencial que garantirá não apenas sua competitividade, mas também o fortalecimento de todo o ecossistema nacional de cloud.

(*) Vice-Presidente de Comunicação e Marketing da AbraCloud – Associação Brasileira de Infraestrutura e Serviços Cloud; e Senior Business Advisor da SC Clouds.
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